A arte tem se consolidado como uma importante aliada no desenvolvimento de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), contribuindo para o estímulo da comunicação, da sociabilidade e da autonomia. No Brasil, iniciativas que integram arte e neurodiversidade têm ganhado visibilidade e apoio, tanto em ambientes clínicos quanto educacionais e culturais, com resultados consistentes no bem-estar e crescimento pessoal de autistas. De acordo com dados do CDC (Centers for Disease Control and Prevention), uma em cada 36 crianças está dentro do espectro autista. No Brasil, embora não existam levantamentos oficiais recentes, estimativas do Ministério da Saúde apontam que cerca de 2 milhões de brasileiros são autistas. E, nesse contexto, a arte tem se mostrado um instrumento cada vez mais eficaz na promoção da inclusão, autoestima e desenvolvimento cognitivo.
Pessoas com TEA costumam apresentar dificuldades na comunicação verbal e na interação social, além de padrões comportamentais restritivos ou repetitivos. A arte – em suas diversas formas como pintura, escultura, música, dança e teatro – oferece uma linguagem simbólica e sensorial que permite a expressão de sentimentos e pensamentos muitas vezes difíceis de verbalizar. Um estudo da Universidade de São Paulo (USP), publicado na revista Frontiers in Psychology, concluiu que atividades artísticas regulares promovem ganhos significativos em aspectos emocionais e comportamentais de crianças autistas. Outro levantamento, da Associação de Amigos do Autista (AMA-SP), aponta que 78% dos participantes de oficinas artísticas apresentaram melhoras em áreas como concentração, coordenação motora e comunicação não verbal.

Entre os nomes que vêm se destacando no cenário da arte e neurodiversidade está Manoela Bourel, artista plástica, ceramista, cantora, compositora, mãe e mulher autista. Nascida na Chapada Diamantina, Manoela encontrou na arte uma linguagem vital para existir no mundo. Diagnosticada com autismo apenas na vida adulta, passou a entender melhor suas percepções singulares e hipersensibilidades, características que permeiam sua produção artística. “A arte me salvou. Ela foi e continua sendo meu idioma mais sincero”, afirma Manoela, que também desenvolve projetos com outras mulheres neurodivergentes.
Sua obra transita entre o surrealismo mágico e o expressionismo intuitivo, abordando temas como ancestralidade, natureza e o feminino plural. Manoela também é ativista dos direitos das pessoas com TEA, utilizando sua trajetória como forma de educação e sensibilização social. Iniciativas que fazem a diferença – Diversos projetos pelo país têm se dedicado a utilizar a arte como ferramenta de apoio a pessoas autistas. Um exemplo é o Instituto Olga Kos, em São Paulo, que promove oficinas de artes plásticas, música e dança para pessoas com deficiência, incluindo o autismo, integrando inclusão social com desenvolvimento cognitivo.

A arte como política pública – Especialistas defendem que a inserção de atividades artísticas no tratamento multidisciplinar de pessoas com TEA deveria ser parte das políticas públicas. Embora a Lei Berenice Piana (12.764/2012) reconheça os direitos da pessoa com autismo, ainda há lacunas no acesso a terapias complementares como a arteterapia — que não está devidamente regulamentada ou incluída nas diretrizes do SUS. A professora e arteterapeuta Lúcia Helena Arantes, da UFMG, destaca: “Precisamos superar a visão assistencialista e enxergar o autista como um sujeito criador. A arte não é só reabilitação, é potência existencial.”
A arte, mais do que um recurso terapêutico, tem se mostrado uma verdadeira ponte entre o mundo interno da pessoa com TEA e a sociedade. Ao proporcionar expressão, identidade e pertencimento, ela se transforma em ferramenta de inclusão, respeito e cidadania. A trajetória de Manoela Bourel, como artista, mulher e autista, é prova viva desse poder transformador. E nos lembra que, num mundo muitas vezes ensurdecedor, a beleza e a força do silêncio criativo podem gritar por justiça, espaço e reconhecimento.
Dados citados:
CDC – 2023: Prevalência de 1 em cada 36 crianças no espectro.
AMA-SP – 2020: 78% de melhora em participantes de oficinas artísticas.
USP – Frontiers in Psychology – 2021: Estudo aponta benefícios emocionais e cognitivos com arte.
Ministério da Saúde – estimativa de 2 milhões de autistas no Brasil.