A arte é muitas vezes tratada como luxo. Mas, para milhares de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), ela é uma necessidade — uma ponte entre o mundo interno e o externo, uma forma de comunicar o que não cabe nas palavras, uma âncora de identidade e pertencimento. Em meio às batalhas cotidianas travadas por mães atentas, criativas e incansáveis, emerge uma causa que se torna mais urgente a cada dia: a causa artista, aquela que transforma diagnósticos em caminhos e limitações em potência criativa.
Nesse cenário de luta, sensibilidade e transformação, desponta Manoela Bourel — artista plástica, ceramista, cantora, compositora, mãe e mulher autista — como símbolo vivo do que a arte pode revelar e curar. Sua história, como a de tantas outras mulheres no espectro, é atravessada por silêncios, mal-entendidos, superações e reinvenções. Diagnosticada apenas na vida adulta, Manoela finalmente encontrou o nome que explicava o mundo interno intensamente sensorial e criativo que sempre a habitou.
A Arte como Terapia, Comunicação e Existência – Estudos apontam que atividades artísticas impactam diretamente no desenvolvimento de habilidades sociais, cognitivas e motoras de pessoas com TEA. Desenho, pintura, escultura, música e dança não são apenas “oficinas” ou “entretenimento”, mas verdadeiros dispositivos terapêuticos e afetivos que permitem a exploração de sentimentos e a construção de narrativas próprias.

No caso de Manoela, a arte não é apenas parte do tratamento: é sua linguagem primeira. Desde criança, ela encontrava no traço e na textura uma forma de acalmar o caos sensorial e organizar as emoções. Hoje, ela transforma esse talento em obras de profundo impacto visual e simbólico, trazendo uma perspectiva única sobre o mundo e sobre si mesma.
“Imensidão Íntima do Invisível”: Uma Exposição que Fala com os Sentidos -Em agosto de 2025, Manoela realiza sua primeira grande exposição oficial: “Imensidão Íntima do Invisível”, um conjunto de pinturas em óleo sobre tela que transcende o visual para tocar o sensorial. Usando também pedras naturais, sementes, tecidos e objetos simbólicos, Manoela propõe ao espectador um mergulho em paisagens afetivas que dialogam com sua infância na Chapada Diamantina, com os silêncios da adolescência e com os ciclos criativos da maturidade.
As telas são como mapas emocionais — ora vibrantes, ora contidas — que revelam camadas do espectro autista com rara poesia. Cada obra convida ao toque, à escuta e à contemplação. A exposição, que acontecerá no mês de agosto, em São Paulo, é mais do que um evento artístico: é um manifesto sensível sobre a pluralidade das mentes e a urgência de espaços inclusivos para artistas neurodivergentes.
Mães de Autistas: Uma Luta Invisível – Por trás de muitos artistas autistas está o olhar atento e amoroso de mães que abriram mão de planos, enfrentaram preconceitos e se tornaram especialistas em afeto, neurociência e criatividade. São mães que enxergam o invisível, que escutam o que não é dito, que lutam por terapias públicas de qualidade, escolas acolhedoras e políticas culturais que considerem seus filhos como cidadãos plenos.
A história de Manoela também reverbera nessas mulheres, que veem na arte não apenas uma expressão, mas um direito humano fundamental. Em um país onde o autismo ainda é pouco compreendido e mal assistido pelo poder público, a arte surge como ferramenta de resistência, de inclusão e de autonomia.
A Causa Artista: Muito Além da Estética – Falar da causa artista é reconhecer que arte e saúde mental caminham juntas. É defender que políticas culturais sejam construídas em diálogo com a diversidade neurológica. É garantir espaços, editais, exposições e oficinas acessíveis. É incluir vozes como a de Manoela Bourel nas galerias, nas escolas, nas feiras de arte e nas mídias. É entender que a arte produzida por pessoas autistas não deve ser romantizada, nem reduzida a terapia: ela é criação potente, ela é política, ela é cultura.